Testes, inimigos e aliados

Diário de guerra. Septuagésimo terceiro dia. Entramos em território desconhecido. A atmosfera é instável e ainda não conseguimos encontrar fonte de água. A nossa chegada aconteceu ontem à noite, após escaparmos de nossa última locação com vida. A moral da equipe está destruída. Agiremos daqui em diante com cautela. O ataque surpresa que sofremos foi, sem dúvidas, um grande choque. Não esperávamos que um dos nossos pudesse ser um espião infiltrado.

Fazemos identificação de campo. Nível de oxigênio, pureza do ar, radiação… Percebo que a equipe está mais exaltada que o normal. Seguimos sem saber se estamos em território seguro. Estamos em eminente espera de um novo ataque. Infelizmente, a confiança da equipe se quebrou, e esse ataque pode vir até mesmo de um de nós. É inacreditável o que uma guerra faz conosco, nos coloca uns contra os outros.

O nível de tensão é extremo. Um leve movimento de mãos passa a ser lido como um aceno para tropas inimigas, uma fala irônica passa a ser uma declaração de nova guerra. Tentamos manter todos os nossos no nosso campo de vista. Se algum se afastar um pouco mais, acreditamos que seja um infiltrado e confiscamos suas armas. Temos um dos nossos retirado em quarentena. Ele está em constante observação e, ao menor sinal de movimento, estamos preparados para responder com violência. Fazemos interrogatórios frequentes, e cada minuto que sobrevivemos é uma vitoria estrondosa.

Receio que nunca mais será o mesmo. Cada metro que avançamos, estamos mais perto das linhas inimigas, e os desafios vão se intensificando. Tentamos uma aproximação perigosa e não sabemos em quem podemos confiar. Quais são nossos aliados? Quais são os nossos inimigos? Tudo está nebuloso. É difícil dizer o efeito que isso terá sobre nossa vitória. Somos uma equipe desunida, fragmentada, destruída. Não é preciso de uma arma ou granada para nos destruir. Basta um olhar estranho de um de nós e já teremos motivo o suficiente para causar a nossa própria morte.

São momentos sombrios. Tento manter a esperança de que melhorarão. Tento guiar meus homens para confiarem em si mesmos, mas temo ter perdido a voz da liderança. Não confiam mais em mim, e temo ter sido o responsável por isso. Fiz escolhas difíceis e talvez algumas tenham sido equivocadas, mas faço o melhor que posso com o pouco que tenho.

Os resultados da análise comprovam que o ar é respirável e que o entorno é seguro. Um dos meus conseguiu encontrar um filete de rio. Desconfiamos até do território. Alguns não querem beber, a despeito do que os testes mostram. São momentos sombrios.

Cambio, desligo.

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